VIAGEM AO JURUÁ DE MINHA INFÂNCIA
Querido
diário: O Juruá de minha infância já não é mais o mesmo. No trecho entre
Cruzeiro do Sul e a cidade de Ipixuna, o rio agoniza,pede socorro. São muitos
os bancos de areia e as árvores caídas ao longo de seu leito, tornando-se um
perigo constante até mesmo para as pequenas embarcações que ousam viajar nesse
período de vazante do rio. Provavelmente dentro de 10 a 20 anos no máximo se
nenhuma medida ambiental for tomada com mais rigor, à navegação no Juruá será
impossível nos meses de junho a outubro. O rio a cada ano fica mais assoreado
devido não só a poluição e ao desmatamento de suas margens e igarapés, mas
também pela a ação natural da cheia do rio que remove terra e árvores de seu
barranco e as carrega para o fundo do rio. As muitas embarcações que navegam
rio acima, rio abaixo, não se preocupam se quer em colocar uma plaquinha em seu
interior solicitando aos viajantes que: NÃO JOGUEM LIXO NO RIO ,ou
lixeiras.Uma medida que deveria ser tomada em conjunto pelos representantes das
cidades de Cruzeiro do Sul,Guajará e Ipixuna, seria a retirada das árvores
maiores que ficam expostas nos bancos de areia que se formam na vazante no meio
do rio,assim como parte dessa areia.Medida cautelar,que evitaria muitos
contratempos,visto ser comum na região as embarcações terem seus cascos
perfurados por esses troncos no momento em que o rio começa a encher.
Viajamos da cidade de Cruzeiro do Sul/AC até o antigo seringal Pernambuco, no
mês de setembro de 2013. Nesse trecho do rio, poucos foram os botos cor de Rosa
e tucuxi que vimos subindo a superfície para respirar. Muitos desses golfinhos
de água doce que habitam o Juruá, hoje nadam sozinhos, diferente de outrora
onde eles nadavam sempre em dupla ou em quádrupla. Também não observei
nenhum rastro de tartarugas, ou qualquer outro cágado da região nas areias das
praias por onde passei, para realizarem ali sua desova.A pesca na piracema é
uma prática comum entre os ribeirinhos e o descarte dos peixes menores também
não é feito pelo pescador.Serão poucos os cardumes de
pacus,sardinhas,branquinhas,piaus e outras espécies de peixes que conseguirão
chegar até a cabeceira do rio para ali realizarem a
desova.
Tracajás tomando banho de sol nos
galhos secos das árvores caídas ao longo dos barrancos do rio foram poucos, e
apenas um jacaré foi visto tomando banho de sol à beira rio. Garças e muitos outros
pássaros da região como o corta água, (pequeno pássaro que voa rente ao rio e
no momento oportuno mergulha o bico para pescar um peixe), já não se ver em
grandes revoadas. Óleo de copaíba e Andiroba também não encontramos mais.
Peixe-boi então beira a extinção. Na outra margem do rio, em frente à cidade de
Ipixuna os cacaueiros eram abundantes, hoje segundo uma amiga já não existem
mais.A Hevea brasiliensis sustentação econômica até os anos 1960 dos
seringais do Município,hoje são derrubadas pelos ribeirinhos como se fossem uma
árvore qualquer,já que não tem mais nenhum valor comercial por essas bandas.Não
encontrei nenhuma semente de seringueira baixando o rio, e poucos foram os
chumaços de algodão que vi descendo o mesmo,como era de costume.Sementes de
olho de boi,que recolhíamos para brincar de pedrinha,também não vi nenhuma.Quem
sabe quando o rio estiver cheio o quadro seja diferente.Em compensação observei, fardos e mais fardos de sementes de murmuru expostas ao longo das praias para serem
vendidas à Natura Ekos,segundo me informou um viajante da lancha.
Não sabe talvez o ribeirinho que tira da floresta esse recurso imediato para
sustento de sua família,que em pouco tempo já não será mais possível
atender a demanda de produção exigida pela Natura, e esta, se deslocará
para outros rios da região Amazônica, dando continuidade à exploração dos
recursos naturais até a sua total extinção. Deixando, portanto inúmeras
famílias sem renda e pior, sem se quer um coco de murmuru para o próprio consumo.
Há tempos a seringueira sofreu o mesmo processo exploratório. Não se
preocuparam os gananciosos seringalistas em promover o plantio da espécie
acreditando provavelmente ser esta uma fonte inesgotável, mas o seu ciclo teve
um fim. Hoje apenas no Acre ainda se produz látex para a confecção de
preservativos.A retirada dos bens da floresta sem reposição e a derrubada de
árvores para o plantio de sua roça,muitas vezes é a única opção de trabalho e renda que esses ribeirinhos tem para sobreviverem isolados na floresta.
Chegando a Ipixuna assustei-me quando vi o Igarapé Turrufão. Nele costumávamos
tomar banho e pescar em qualquer época do ano, mas agora se encontra
completamente seco. O desmatamento de suas margens seja para a criação de
bovinos,seja para a construção de casas residenciais assim como o lixo
doméstico jogado ali, contribuíram para acelerar o processo de assoreamento de tão
importante curso d’água. Muitas fontes de água da cidade já secaram e os
moradores já não contam mais com os balneários naturais dos igarapés mais
próximos à ela nessa época do ano.Tendo muitas vezes que se deslocarem para
as comunidades vizinhas ou usufruírem desse lazer nos banhos de açudes
artificiais, localizados nos sítios particulares.
Quanto à cidade de Ipixuna confesso que fiquei surpresa e ao mesmo tempo
decepcionada. Surpresa pelo crescimento da cidade que transpôs e muito aquele
pequeno perímetro urbano que conheci há quase 29 anos atrás. Decepcionada pela
destruição do Patrimônio Histórico. Senti falta da Usina de Arroz e de seu
beco. Hoje em seu lugar encontra-se um Hotel e em baixo deste a agência do Bradesco. O beco que ficava ao lado da usina ainda está
lá, um pouco mais estreito e sujo,já não serve mais de passagem à
pedestres como antigamente. O engenho de açúcar já não existe mais e seu antigo
terreno deu lugar a várias residências. Suas engenhocas e sua história foram
desprezados e abandonados por aqueles que deveriam cuidar e zelar pelo bem
público. Um descaso e uma afronta ao Patrimônio, a história e a memória da
cidade e de seus antigos moradores.
Segundo o RADAMBRASIL nos anos
1970 o Município era autossuficiente na produção de açúcar mascavo, farinha e
arroz, vendendo sua produção para algumas cidades vizinhas do Vale do Juruá.
Hoje seus moradores chegam a pagar na saca de farinha o preço exorbitante de R$
180,00 a R$ 200,00 reais, quando encontram farinha para comprar. A falta de
investimento na agricultura familiar levou muitos ribeirinhos a
abandonarem suas comunidades e migrarem para a cidade em busca de melhor
qualidade de vida.Investir no pequeno agricultor,dar suporte técnico e fazer
chegar na cidade seja via estradas de rodagem ou via fluvial sua produção,
oportunizando sua venda em feiras livres será a melhor saída para o crescimento
econômico do município,bem como para a permanência de maneira digna de muitas
famílias em suas comunidades de origem.
A
Biblioteca Pública Municipal, também já não existe mais. Em seu lugar
encontra-se a Casa de saúde Indígena. Lembro com ternura desse espaço onde
costumava jogar varetinha,baralho e outros jogos lúdicos com minhas
amigas,assim como dos muitos livros da Literatura nacional e estrangeira que
peguei emprestado para ler em casa.Um deles “E o Vento Levou” com suas mais de
800 páginas degustei em poucos dias, emocionada não só com a linda e impossível
história de amor entre Scarlett e Ashley,mas também pelo conteúdo
histórico da Guerra Civil Americana entre os Estados Sul e os Estados do
Norte.Ipixuna é a única cidade que visitei nessa minha andança pelo norte do
país que não conta mais com uma Biblioteca Pública Municipal.Uma pena! Onde foi
parar seus muitos livros, suas fichas e seus registros?Será que pode um
Município ficar sem Biblioteca Municipal?O cidadão Ipixunense não tem mais o direito
de usufruir desse espaço cultural?
Outro
bem público que senti falta foi à escola Estadual Morcy Barroso, que chamávamos
de Pinico Sem Tampa. Muitos cidadãos Ipixunenses da minha idade passaram por
seus bancos escolares, e tiveram a oportunidade de serem alfabetizados pelas
professoras Iraci de Lima e Dona Tomázia. Pois bem amigos!Recordar esse passado
não será mais possível. O antigo Pinico Sem Tampa também ruiu no tempo e seu
terreno hoje estar sendo aterrado para instalação de um futuro Posto de
Gasolina que segundo fui informada. Porque a obra não é embargada?Não
seria mais útil construir ali um Museu Municipal,um espaço de história, de memória
e de identidade do seu povo?
Quero registrar também o abandono
particularmente do antigo prédio do Mercado Municipal e da Coletoria. O antigo
prédio da Coletoria construído em 1957, hoje se encontra em total abandono,
abrigando em seu interior uma família, que mora ali não sei se com o
consentimento do poder local, ou não. O antigo Mercado Municipal hoje
Secretaria de Cultura também mostra sinais de abandono e falta de zelo. Uma
total falta de respeito com os primeiros prédios construídos na cidade. A Secretaria de
Cultura Municipal tem o dever de zelar e de preservar os prédios públicos,assim
como a população civil,sob pena de não deixar morrer a história e a memória local.
Passei alguns dias
na comunidade Pernambuco, antigo remanso,hoje uma vila bastante povoada.Possui
escola rural,posto de saúde,templos religiosos,associação de moradores,dois
engenhos de açúcar para fabricação de gramichó,duas
caixas d'água que nunca jorraram água nas torneiras das casas.Tendo
os moradores que descerem até o rio ou irem ao igarapé ou ainda a suas cacimbas
domésticas para realizarem suas atividades diária e sua higiene pessoal.O
calçamento das suas longas ruas se deu pela metade,apenas o meio fio foi feito por
onde os transeuntes passam.Sempre fico me perguntando quando vejo essas obras
incompletas:Onde foi parar os recursos destinados a elas?Visto que quando se
olha o site do Portal da Transparência Municipal lá estão elas
como concluídas?Enquanto as respostas as minhas indagações não vem sigo
meus escrito para dizer que fiquei muito feliz em encontrar ali no porto de
Pernambuco a família do indígena da etnia culina: seu Agostinho
Culina compadre de meus pais, sua esposa, dona Tereza,sua filha Rita,netos e
sobrinhos.Todos estavam indo para a cidade receber suas aposentadorias como
fazem todo mês.Conversamos tiramos fotos e marcamos de
nos reencontrar em Ipixuna o que não foi mais possível, pois quando
lá cheguei os mesmos já tinham descido o rio para sua aldeia, localizada no
Igarapé Grande.Ao retornar à cidade fiquei chocada com a cena que
presenciei:Índios da etnia Culina moradores do Igarapé Grande e do Piau
acampados em barracas de lona na frente
da cidade. Lastimável e inconcebível tamanho descaso
público com os indígenas ipixunenses.
Tantas outras considerações
poderiam ser elencadas aqui sobre o que vi e ouvi da cidade e das pessoas, mas
vou finalizar esse diário da Viagem ao Juruá, externando meu apreço e admiração
a todos que me acolheram. E dizer que fui muito bem recebida por todos:
Parentes, amigos e admiradores de meu pai e de minha mãe. Senti-me em casa
novamente, mas não posso deixar de expressar aqui meu pensamento crítico sobre
os fatos que relatei acima. São a meu ver críticas construtivas, que espero
possam contribuir para um novo olhar sobre o Patrimônio material e imaterial do
Município de Ipixuna. Não são informações novas e nem tão poucas desconhecidas
da população local, fazem parte do cotidiano das pessoas, mas as fiz nesse
espaço por amor a minha terra natal. Mesmo sendo uma filha ausente por
circunstância do destino tenho tanto amor e zelo por esta cidade quanto
qualquer um de seus filhos que nunca saíram dela.Meu olhar é, eu confesso mais
crítico por já ter rodado um pouco por esse Brasil e podido perceber que muitos
municípios brasileiros com as mesmas características de Ipixuna estão em
situação econômica e cultural melhores.Portanto,acredito que muito ainda se pode fazer por esse Município,para que seus cidadãos possam futuramente chegar em
qualquer cidade maior ou menor do Amazonas e do Brasil,inflar o peito e dizer
com orgulho que são filhos dessa terra!
Já
estou com Saudades de todos!!!!
Verônica
Lima
Rio de janeiro,06 de Outubro de 2013.
Fotos da Viagem ao Juruá
Setembro/2013.
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Menino tomando banho no rio Juruá em meio a tronco de árvores caídas no leito do rio que já se encontra assoreado. |
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Tronco de árvore encalhado no banco de areia no rio Juruá. |
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Banco de área e arvores caída no meio do rio dificultam a navegação na vazante do Juruá |
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Igarapé Turrufão. Ipixuna/AM.Totalmente seco |
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Vista da Cidade de Ipixuna/AM. |
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Comunidade de Pernambuco.Ipixuna/AM. |
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Agricultor indo para a sua roça. |
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Lenha para a moenda. |
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Igarapé. |
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Engenho de Açúcar,comunidade pernambuco/AM. |
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Açúcar mascavo na gamela. |
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A garapa caindo no tacho. |
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Uma paradinha praia para tirar a água do joelho.Será que pode?.ksks |
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Mel de cana-de-açúcar |
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Menino carregando bagaço de cana. |
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Melando a cana para puxar o alfenim |
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Recebendo o apoio do meu primo Ge. |
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Alfenim pronto. Hummmm!!! |
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Aqui observa-se o calçamento pela metade,ou seja apenas o meio fio. |
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Adicionar legenda |
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Alunos indo à escola. |
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Caixas d'água que nunca funcionaram |
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Tereza Culina,esposa de seu Agostinho.Etnia Culina |
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Seu Agostinho Culina |
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Rita Culina |
Por: Verônica Lima e Silva
Querido diário.
No mês de fevereiro de 2012, saíamos da rodoviária Novo Rio, na cidade do Rio de janeiro em direção a Belo Horizonte para realizar uma viagem de trem.
Há tempos eu alimento um desejo de andar de
trem pelo interior do Brasil. Sonho, eu diria impossível de se realizar, não
fosse o abandono e o sucateamento que estas ferrovias sofreram na década de
1960, quando as pessoas gradativamente foram trocando o velho e seguro
trem pelo rápido e confortável carro.
A Estrada de Ferro Vitória-Minas,1 que
vamos percorrer,é uma das poucas que transporta passageiros no país.Além desta
tive a oportunidade de conhecer a Estrada de Ferro Carajás.Pará/Maranhão,
quando minha mãe que passava uns dias conosco na cidade de Marabá/PA,em
1990,viajou de trem para visitar uma amiga sua em São Luiz do Maranhão. Mas,
diferente do trem mineiro que oferece passagens diariamente, o de Carajás,
parte em dias alternados da cidade de Parauapebas/PA, até São Luiz do Maranhão.
Chegamos a BH em pleno
domingo de carnaval antes das cinco horas da manhã e nos dirigimos à
ferroviária para comprarmos as passagens até Vitória.Mas quando os portões da
estação se abriam às 6 horas da manhã, o guarda foi logo avisando que para
aquele dia não haviam mais passagens.
Tudo bem!Compraríamos as passagens no dia
seguinte. Assim aproveitávamos para conhecer a Capital Mineira.
Procuramos um hotel para deixar nossas coisas pegamos
um ônibus e fomos caminhar na Lagoa da Pampulha.2
Eu
nunca estivera ali na terra de Juscelino, e poder admirar aquela paisagem toda
e caminhar em volta da represa visualizando seus monumentos parques e jardins,
além de conhecer a história do lugar ia ser muito agradável.
Logo que chegamos
avistamos uma numerosa família de capivaras à beira da lagoa tirando a sesta
tranquilamente depois do almoço. Um vendedor de picolé muito simpático
deu-nos boas dicas sobre a cidade, além de nos proporcionar gostosas
gargalhadas com suas piadas de mineiro.
Caminhamos até a Casa
do Baile3, onde uma exposição sobre o ofício de Lambe-Lambe
(fotógrafos de jardins) me levou de volta à infância. Lembrei-me com
ternura destes profissionais que todos os anos durante as festas
religiosas de Nossa Senhora Das Dores e de São Francisco de Assis, nos
meses de Setembro e Outubro chegavam a cidade de Ipixuna no Amazonas para tirar
fotografias.A família toda reunida se punha em frente a um grande painel
pintado,enquanto as crianças eram colocadas em cima de um burrinho de
madeira.Aos olhos dos curiosos ali presente o fotógrafo registrava a imagem
para a posteridade.
Para matar a saudade
daquele tempo, tirei uma foto montada no burrinho de madeira da exposição, como
se fosse aquele de minha infância. Como eu ia imaginar que depois de tantas
tecnologias nas máquinas fotográficas atuais, eu encontraria ali diante de meus
olhos uma exposição que resgatasse a minha infância,e me fizesse lembrar de
nossas carinhas felizes e ao mesmo tempo surpresas, ao visualizarem nossa
imagem revelada no fundo do monóculo?(Pequeno objeto de plástico com uma
lente que permiti visualizar com um olho só a imagem refletida no fundo em
miniatura).
Em História e Memória, 1924
Jacques Le Goff 4nos diz que “a fotografia (...)
revoluciona a memória: multiplica-a e democratiza-se, dá lhe uma precisão e uma
verdade visuais nunca antes atingidas, permitindo assim guardar a memória do
tempo e da evolução cronológica”.Realmente a fotografia é um documento
importante para o resgate da memória.Ao olhar a exposição dos retratistas
Lambe-Lambe mineiros e suas fotografias sociais expostas na Casa do Baile,pude
voltar no tempo e lembrar com carinho de meus pais,irmãos,amigos e do arraial
religioso na pequena cidade em que nasci.
O dia estava quente e ensolarado,
mas ali embaixo daquelas frondosas árvores o clima era ameno e uma brisa suave
se fazia sentir a todo instante. Lá longe na outra margem da lagoa avistamos
uma Igrejinha, caminhamos até ela, pagamos R$ 1,00 e entramos para conhecer o
seu interior.
Um grupo de
pessoas admiravam a pequena capela, enquanto as palavras do guia iam
narrando a sua história. Ficamos sabendo que esta Igreja de São Francisco de
Assis faz parte assim como o Museu de Arte, a Casa do Baile e o Iate Tênis
Clube, do Conjunto Arquitetônico da Pampulha encomendado por Juscelino
Kubitschek ao arquiteto Oscar Niemeyer, como parte do projeto de modernização
da cidade, quando Juscelino foi prefeito de Belo Horizonte entre 1940 a 1950, e
ainda que a igreja encontra-se tombada desde 1984.
Diferente de
todas as igrejas que eu já visitei esta capela de São Francisco da Pampulha,
não tem cruz no altar. Em seu lugar encontra-se um grande painel pintado por
Cândido Portinari. Nele observa-se que o personagem principal retratado pelo
artista não é Jesus Cristo nem sua mãe e nem seus discípulos e sim, São
Francisco de Assis, a religiosa Clara e seus seguidores famintos, leprosos e
miseráveis.
Um escândalo
para a época que levou o arcebispo Dom Antonio dos Santos Cabral, se recusar a
consagrar a igreja assim como proibir o culto por 14 anos na capela,informa o
guia. Outro dado interessante é que o mesmo artista nos 14 painéis da Via Sacra
usou as mesmas representações sociais.
Depois
da visita à igrejinha fomos ao parque de diversões localizado atrás desta.
Andamos em diversos brinquedos e no final da tarde voltamos ao hotel. No dia
seguinte fomos os primeiros a chegar à estação. Aos poucos mais e mais pessoas
iam se juntando a nós e às seis horas da manhã quando a bilheteria se abriu já
era grande o número de pessoas que assim como nós também iam fazer a mesma
viagem. Compramos nossas passagens para a classe executiva e ficamos no salão
esperando à hora do embarque.Durante a viagem percebemos que a classe econômica
para o turista é melhor.Diferente da classe executiva esta tem as janelas
aberta por não ter ar condicionado, o que permite uma visão mais ampla do
percurso,tanto do lado direito quanto do lado esquerdo.Ar condicionado não se
faz necessário, o clima mineiro é muito ameno.
Não
somos mineiros e por isso quase perdemos o trem. Por este motivo tivemos que
embarcar na classe econômica e por esta chegar à classe executiva. Passamos
pela cozinha de onde exalava um cheiro gostoso de café pelo carro-restaurante e
finalmente chegamos ao vagão E 4, onde as poltronas 23 e 24 nos esperavam para
a longa viagem.
Pontualmente
as 07h30min o maquinista dar o apito da partida, e por entre as matas o trem
segue seu caminho deslizando lentamente sobre os trilhos. O trem mergulha
por túneis,passa em baixo de pontes em cima de rios e córregos,atravessa
pequenos lugarejos, plantações e moradias simples
encravadas nos vales e montanhas do meio rural mineiro.Tudo isso observado pela
janela enquanto escrevo.
Ao longo do
percurso o Rio Doce serpenteia a estrada de ferro, hora a direta, hora à
esquerda. Com suas barrentas águas este rio é essencial para a vida local, pois
nele se vê ao fim da tarde, homens, mulheres crianças e animais, buscando o
alimento diário.Ao longo do percurso o trem faz rápidas paradas para embarque e
desembarque de passageiros ali mesmo na beira da ferrovia,visto que na maioria
das estações não existem plataformas.
O serviço de bordo é excelente.
Um garçom passa com um carrinho, vendendo refrigerantes, sucos,
pão,biscoitos café,com exceção de bebidas alcoólicas.Momento em que o
mesmo passageiro à passageiro vai informando o cardápio do dia e
fazendo a reserva para o almoço.Que pode ser servido tanto na própria poltrona
do passageiro,quanto no carro-restaurante. Pedimos nossa refeição para ser
saboreada ali mesmo na poltrona.
Uma atitude aparentemente
simples me chamou a atenção. Foram-nos entregues por ocasião do lanche da
manhã três sacolas plásticas de cores diferentes. O maquinista informava que as
mesmas eram para colocarmos o lixo. Na sacola azul deveríamos colocar papel, na
cinza o lixo não reciclável e na vermelha os lixos de plástico, tais medidas
orientava o funcionário fazem parte de nossa política de preservação do meio
ambiente que visam não só a reciclagem do material recolhido como também
proporcionar maior segurança na ferrovia.Informações como esta de
conscientização para preservação do meio ambiente são sempre bem vindas.
Olho as pessoas a conversar despreocupadas às portas de suas casas a beira da
ferrovia e lembro-me de Geraldo Viramundo, personagem de Fernando Sabino 5,
que apostou com seus amigos que fazia o trem parar na pequena Rio Acima. E fez
mesmo!Deitado nos trilhos, Viramundo pediu e implorou a Deus que o trem
parasse. O maquinista desesperado apitou uma, duas, três e sei lá quantas vezes
mais e o menino não saiu dos trilhos, só restando ao ferroviário fazer o trem
parar a qualquer custo. Viramundo, quando percebeu que o trem parou saiu
gritado orgulhoso para seus companheiros. Eu fiz o trem parar!Eu fiz o trem
parar!
Prossigo meus
escritos e registro nas páginas da caderneta o vai e vem dos trens que passam
por nós em sentido contrário. Trens cargueiros, com seus infindáveis vagões
abarrotados de produtos. São os minérios mineiros que seguem rumo a Europa, ou
a siderúrgica de volta Redonda no Rio de Janeiro.
Ao longe nas montanhas as
profundas voçorocas provocadas pela derrubada da mata nativa deixam a mostra o
barro vermelho da terra, a contrastar com o verde das plantações nas áreas
próximas ao Rio Doce. Mas este não é o único contraste que observo na paisagem
mineira. Antigos e abandonados casarios em estilo colonial, lembram o apogeu
das minas gerais oitocentista, enquanto pequenas e simples moradias construídas
bem próximas a estes, nos remetem a pobreza atual em que vivem muitos
camponeses brasileiros.
Já era noite
quando chegamos a Vitória/ES.Pegamos um ônibus para a Rodoviária em busca de um
hotel para pernoitar.A final de contas estávamos exaustos depois de quase 13
horas de viagem.Precisávamos de um bom banho e uma cama aconchegante para
dormir,pois no dia seguinte pretendíamos conhecer Guarapari.Não sem antes
conhecer as lindas praias do litoral capixaba.Mas esta é outra história.
Fim....
1.A Estrada de Ferro
Vitória-Minas(ES-MG).É usada para escoar o minério de ferro,aço,carvão e diversas
cargas de Minas para o exterior.Juntamente com a Estrada de Ferro
Carajás(Pará-Maranhão).São as duas únicas ferrovias que ainda fazem transportes
de passageiros no Brasil em longa distância.Sendo atualmente administradas pela
Vale S.A.,antiga CVRD(Companhia Vale do Rio Doce).
2.Lagoa situada na região da
Pampulha em Belo Horizonte/MG.Faz parte de um conjunto arquitetônico com várias
atrações turísticas e foi projetada por Oscar Niemeyer em 1943,quando Juscelino
Kubitschek foi prefeito da cidade de BH.
3 Situada numa pequena ilha,a
casa de Baile faz parte do conjunto arquitetônico da Pampulha projetado por
Niemeyer.Foi inaugurada em 1943,e funcionou como casa de baile até 1948.
4.Jacques Le Goff. Historiador
Francês ,especialista em História Medieval.
5.Fernando
Sabino (1923-2004).Escritor mineiro autor de inúmeros livros,dentre eles O
Grande Mentecapto,1979. Onde narrar as venturas e desventuras de Geraldo
Viramundo, principal personagem do romance .
Venho mais uma vez registrar minhas andanças pelo interior do país em suas
amigáveis páginas. Dessa vez a viagem se deu de carro pelo litoral
sul-fluminense, especificamente pelas maravilhosas cidades da costa verde:
Frade, Mambucaba, Trindade e Paraty, situadas ao longo da BR 101, rodovia
Rio-Santos.
No dia 6 de julho de 2013, parti com destino a Vila de Frade, onde fui visitar
uma grande amiga. Juntas, fomos conhecer as já mencionadas cidadezinhas acima.
Primeiramente passamos na Vila de Trindade, pequeno lugarejo de Paraty, que
conta com praias e paisagens naturais exuberantes onde se encontram pessoas de
diversos lugares do Brasil, principalmente paulistas, devido à proximidade que
este lugarejo tem de Ubatuba, ficando a uns 22 km aproximadamente deste.
Depois de perambularmos por estas paragens, fomos visitar a 11ª FLIP – Festa
Literária Internacional de Paraty/RJ, que acontece todos os anos no mês de
Julho. Paraty é uma cidade bastante conhecida no mundo inteiro,não só
pela festa literária,mas também pela sua importância histórica.De seu porto nos
séculos dezoito eram embarcados para o porto do rio de Janeiro o ouro das
Gerais que chegavam em lombo de mulas,assim como no século dezenove
o açúcar produzido nos engenhos do Vale do Paraíba e norte paulista,a
serem conduzidos ao Rio de Janeiro e deste ao porto de Lisboa em Portugal.
Nas ruas do centro histórico,as correntes levantadas impedem a passagem
de carros,mas não a de pessoas.Por elas professores,escritores,poetas,músicos e
visitantes em geral,se movimentam de um canto a outro em busca dos mais
variados temas literários reunidos ali de 3 a 7 de julho.Todos os anos a FLIP
homenageia um importante vulto da literatura nacional.Nesta edição o
homenageado foi o escritor alagoano Graciliano Ramos.Na FLIP de 2009,onde
participei pela primeira vez o homenageado foi o poeta pernambucano Manuel
Bandeira.Com uma bela e preservada arquitetura colonial portuguesa
oitocentista, a cidade de Paraty se destaca das demais cidades da região por
seus casarios, armazéns, igrejas, antigos sobrados e seu calçamento de
pé-de-moleque. No fim da tarde a maré invade algumas ruas tornando a cidade
ainda mais encantadora e deslumbrante.
Outro povoado no litoral sul fluminense que visitamos foi a Vila Histórica
de Mambucaba.Uma das primeiras pessoas que conversamos foi o senhor Julio,um
gaúcho que encontramos voltando da padaria,com sua inseparável cuia de
chimarrão.Batemos um longo papo com ele sobre a história da cidade.Seu Julio
nos disse que quando o tráfico de escravos começou a ser proibido pelos
Ingleses no século dezenove era ali em Mambucaba que os escravos
contrabandeados da África aportavam para serem distribuídos às várias cidades
do País.Fomos orientadas por ele a procurarmos o Paulinho,que segundo ele
era um profundo conhecedor da história local,pois nascera ali.Sendo
portanto a pessoa mais apropriada para falar sobre a cidade.
Fomos procurar o Carlinhos e o encontramos na sua venda,localizada na rua do
comércio.Nas paredes do antigo casario colonial encontram-se
pendurados,recortes de jornais, revistas, reportagens e fotos antigas de
Mambucaba. Papéis velhos e amarelados pelo tempo que Carlinhos
guarda com muito carinho,assim como a antiga chave enferrujada da cadeia
pública,numa tentativa particular de preservar a memória da cidade e de seu
pai,antigo morador da Vila. Mambucaba nos disse Carlinhos é o 4º distrito de
Angra dos reis,que parece não dar a devida atenção ao lugarejo.Os turistas que
nela chegam não encontram nem um espaço ou Centro Cultural, onde possam
saber mais informações sobre a história dessa antiga Vila.
Os muitos estudiosos que falaram sobre a Vila
Histórica de Mambucaba que Carlinhos mostrou-nos com orgulho, não se
preocuparam em doar para a cidade se quer um exemplar de sua obra. Impedindo
portanto, que seus moradores possam compreender o seu passado e assim preservar
a memória histórica do lugar em que vivem. Suas praias, caminhos, trilhas
e Patrimônio Histórico
poderiam ser explorados turisticamente gerando renda para a população local e
não apenas para o município de Angra,mas parece não ser isso que
acontece ali.
Ressentido Carlinhos confessou-nos que à época da construção da Rodovia
Rio-Santos, (1972) um vereador tomou emprestado o Livro: O Barão de Mambucaba e
nunca mais devolveu a seu pai.No dia seguinte voltamos a Paraty onde percorri
as livrarias e o Centro Cultural a fim de comprar um exemplar desta obra
para presentear Carlinhos, mas não encontrei.
Uma crítica consistente das pessoas que estavam ali em frente à mercearia e com
as quais conversamos foi sobre o descaso do IPHAN, Instituto
do Patrimônio Histórico Artístico Nacional quanto à preservação dos
Prédios Histórico e Cultural de Mambucaba. Um antigo casarão que permanecia em
pé até meados dos anos 1970, encontra-se hoje em total ruína.O mesmo fim terá a
Igreja de Nossa Senhora do Rosário de Mambucaba que teve suas obras paralisadas
a mais de 7 anos pelo IPHAN, e todo o conjunto
arquitetônico que estão ali desde os séculos dezoito e dezenove ?Não terão as
gerações posteriores o direito de conhecer a história e de ver sua antiga
arquitetura preservada?Argumentavam os moradores.
O visitante que chega à cidade pelo mar não tem mais a visão da igreja e de seu
centro histórico como outrora.Estes encontram-se totalmente escondidos pelos
diversos pontos comerciais irregulares e por duas enormes barracas erguidas
pelo IPHAN desde o inicio das obras de restauração, do
telhado e do forro da igreja de N.S.do Rosário a 7 anos atrás, e que até hoje
permanecem ali sem nenhuma serventia para a população.Outras construções
antigas datadas da década de 1850,encontram-se em má estado de conservação,já
começando a ruí,tal como o antigo casarão que nos anos 70 ainda estava de
pé e, que a partir de seu tombamento pelo IPHAN,segundo os moradores foi
desmoronando aos poucos por falta de manutenção,restando hoje apenas suas
ruínas.
Os moradores locais carecem de uma explicação, quanto à paralisação das obras
de restauração da Capela do Rosário. Assim como se faz imperativo prestar-se
conta do dinheiro público destinado a restauração de todo o conjunto
arquitetônico tombado e não apenas de sua restauração parcial. Tanto por parte
do governo municipal de Angra dos Reis, na pessoa do secretário de Cultura,
quanto pelo IPHAN.
Rio de Janeiro, 07 de julho de 2013.
Fotografia tiradas Na Ilha de Trindade,Paraty e Vila Histórica de Mambucaba,Julho/2013.Arquivo pessoal.
Fotografia tiradas Na Ilha de Trindade,Paraty e Vila Histórica de Mambucaba,Julho/2013.Arquivo pessoal.
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